quarta-feira, 18 de abril de 2012

Viver de verdade!!! >> Texto de 14/09/2009

Ela estava ali, sem piscar. Olhos molhados, cabeça balançando, corpo tremendo. E minhas mãos, apertadas pelas suas.
O nome eu não sabia. aliás, não fazia idéia. Pouco importava. Ela clamava - apenas com um olhar - por um socorro.
Medo. Ela tinha muito medo... e quem não teria?
Apertava a minha mão...
Apertava a minha mão... e seguia sem ter coragem.
Depois de correr da sala de exame por 3 vezes, chorando, desde que apertou a minha mão, não deixou mais a sala.
A médica, que não entendia nada, não sabia se me ouvia ou se seguia insistindo com o procedimento.
"abra a boca e deixa eu te dar essa anestesia. A gente precisa fazer a biópsia de qualquer maneira."

Tem palavras que já assustam sem precisar de uma frase inteira: anestesia, biópsia, câncer. Muitas vezes, mesmo que isoladas, essas palavras dizem tudo.

"Lembra de quando você ia ao dentista e precisava levar uma anestesia? Então... é por isso que o gosto não é bom mas vai fazer todo efeito possível..."
E de onde eu tirei essa frase? Eu nem sabia o que ela tinha! E diferente do dentista (que com apenas umas borrifadas a anestesia já fez efeito), aquele spray que estava ali, ela tinha que ser tomado um vidrinho inteiro.

Ela olhava pra mim e olhava pra médica. Parecia que queria entender como eu estava ali, por que eu estava ali e por que eu apertava sua mão.
Entre uma falta de coragem e outra, mal percebi mas não deixei que a médica conversasse muito.
Segui falando: "Confia em Deus, querida. confia muito, de todo o coração. Você vai ver que quando o seu medo for enorme e você não tem o que fazer, só Ele vai ser capaz de te acalmar e te fortalecer."
A médica olhava pra mim e seguia pedindo que a moça abrisse a boca. enquanto isso, me contava que ela tinha 2 filhos pequenos.

- Filhos pequenos? Mas que coisa mais especial ! Então eles vão conhecer uma mãe muito guerreira a partir de hoje! - disse eu.

Ela gaguejou, sem quase conseguir falar, de tanto que tremia: "Eu não quero, não quero..."

E a médica continuou: "Sua família veio de tão longe, só pra te dar uma força. E você não vai ser corajosa?"

- Sua família está aí? É de outra cidade? Que maravilha que você tem uma família que te ama tanto! Faça isso por eles, querida, pois muitas pessoas gostariam de ter uma família num momento desses tão difícil mas não tem...

Ela fechou os olhos. Fez uma oração bem baixinha, sozinha, apertando as minhas mãos.
Eu não fechei os meus mas também fiz a minha minha. E desejei, verdadeiramente, que Deus tivesse misericórdia daquela mulher.

Ela abriu a boca. Depois da anestesia, ainda deu umas cuspidas. Cansada de relutar e percebendo que fugir não era a melhor opção, optou por enfrentar e tentar, mesmo na dor, experimentar os efeitos da fé.

- Luiza?

(alguém me chamava)

- Ah? - respondi, ainda olhando para a mulher.

- É que o Salomão precisa ir em outro médico agora.

- Tá... to indo... - respondi, ainda com as mãos sendo apertadas pela mulher.

Sem conseguir largá-la correndo, para ir para a sala do outro médico que o Salomao precisava ir, ainda perguntei seu nome.

- Ana. - ela disse.

Dei um abraço forte. um abraço numa mulher que nunca mais vou esquecer na minha vida...
Desejei que ela ficasse com Deus e disse: "Ana, vou pedir a Papai do Céu por você, ta?"

...

A manhã tinha começado muito cansativa. Eu tinha trabalhado a semana toda; tinha estudado no dia anterior à noite; tinha corrido atrás do ônibus que parou uns 50m longe do ponto.
Minha sandália tinha agarrado em vários paralelepípedos da rua enquanto eu corria atrás do ônibus; o motorista voou com o ônibus, "tocando o terror" em todas as curvas.
Eu passei um bom pedaço da noite em claro, pois acordei passando mal. Mas mesmo assim, saí cedo para ir com o Salomão ao INCA (tinha me comprometido a isso), antes de pegar no trabalho.
Nessa manhã, caiu um temporal impressionante no Centro do Rio. As ruas já estavam virando rios... e junto com tudo isso, a cabeça a mil: "Preciso fazer tal coisa hoje no trabalho; preciso marcar tal médico... opa! Aqui tem muita água! Será que o carro passa???!!! Hum... e aquele trabalho da faculdade? Consigo fazer no sábado? Ou domingo? Ih! Chegamos! Não... aqui não dá pra parar com o carro... olha o tamanho da poça pra sair daqui... ai..."

Curioso... justamente essa loucura toda só me mostra o quanto sou feliz.
Feliz por andar, por correr atrás do ônibus, por poder comprar outra sandália, por ter trabalho, por estudar, por ter casa, por ter família, por ver chuva e ver sol, por trabalho da faculdade e direito a fim de semana.
Feliz por ter saúde...
Feliz por pedir a Deus, a cada dia que nasce, que eu perceba todas as dádivas que eu receber.
Feliz por desejar me importar em fazer a diferença na vida de alguém. Assim, nenhum dia é igual ao outro... e até as sextas-feiras chuvosas (cansativas da faculdade do dia anterior e apesar de passar mal de madrugada) não são empecilhos para que eu seja feliz.

E a vida é cheia de coisas mesmo... e é maravilhoso viver de verdade!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.